Disparidade de Fixação (DF) é considerada por Von Noorden (1996), uma variante fisiológica da Visão Binocular normal, onde ocorre um pequeno deslocamento das imagens dentro da área de Panum, perante a existência de fusão. Ogle, o primeiro a demonstrar experimentalmente esta situação, refere que “apesar da compulsão para registar as imagens dióptricas dos dois olhos o mais próximo possível dos pontos retinianos correspondentes, ocorre um ligeiro desvio dos olhos e o correspondente desvio das imagens corticais, embora a fusão se mantenha.” (Ogle cit. in Hurtt et al. 1977).
Este desvio, que pode ser horizontal ou vertical, é muito reduzido (nomeadamente quando comparado com o que ocorre nos estrabismos) não impossibilitando por isso a existência da Visão Binocular, embora possa não estar presente fixação bifoveal. Os valores referidos para o desvio são, para Hurtt et al. (1977) na ordem dos 6 a 10 minutos de arco, podendo no entanto, segundo outros autores, variar entre 5 a 15 minutos de arco.
Existem diversos métodos utilizados no estudo da DF, sendo mais frequentemente utilizados, o teste de Mallet, de Wesson e o Disparómetro. Todos assentam num princípio de funcionamento e objectivo principal, comum.
O paciente, usando óculos de filtros polarizados, ou filtros vermelho-verde, vai observar duas barras, sendo que cada olho só verá uma delas. Para avaliar a DF horizontal são usadas barras orientadas na vertical, enquanto que a DF vertical é estudada com barras orientadas na horizontal. Uma vez que a DF é algo que ocorre na Visão Binocular, é necessário a apresentação de um estímulo visível simultaneamente por ambos os olhos, de forma a possibilitar a fusão. A posição de uma das barras poderá ser ajustada durante o exame (dependendo do exame realizado), até que as barras aparentem estar alinhadas para o paciente, obtendo-se o valor da DF expresso em minutos de arco.
O estudo da DF envolve também a sua medição na presença de diferentes valores de convergência/divergência usando prismas de diferentes potências, o que permite criar um gráfico para a curva da DF. Nesta curva a foria associada (potência prismática que obtém DF nula), corresponde ao ponto em que a linha intercepta o eixo dos xx’s. A intercepção da linha no eixo dos yy’s é a representação da DF habitual, quando não se está a usar prismas.
Hurtt et al. (1977), refere que DF é um termo que tem vindo a ser incorrectamente aplicado na denominação de várias alterações do sistema visual, como heterotropias de pequeno ângulo ou microestrabismos. Na opinião de von Noorden (1996), é ainda uma questão de debate se a DF não passa de um achado laboratorial interessante mas irrelevante na prática clínica, ou se é uma condição que pode representar o primeiro passo entre a ortoforia e a microtropia. Outros autores tentaram estabelecer uma relação entre DF e heteroforia, e embora exista de facto uma associação entre estas duas condições, é também possível encontrar excepções de pacientes eso ou exofóricos que não apresentam DF. Para além disso, os achados clínicos revelam que a DF não tem necessariamente que ser no mesmo sentido da postura fórica inerente.
Constata-se que as causas por detrás da DF, e os fenómenos a ela associados não são ainda totalmente claros, o que se pode considerar como um forte motivo para continuar a estudar, explorar e desenvolver métodos específicos que permitam esclarecer esta condição. Contudo, através de estudos realizados mais recentemente, admite-se que a DF pode ser um forte indicador de uma heteroforia sintomática a descompensar.
“Quanto melhor a cooperação binocular, menor a DF” (Hurtt et al., 1977). Assim sendo, confirma-se a necessidade de realizar este exame na prática clínica, especialmente perante a existência de alterações da Visão Binocular. No estudo realizado por Karania e Evans (2006), é exaltado o facto de heteroforias sintomáticas estarem associadas a valores elevados de DF. Outros autores defendem que o estudo e diagnóstico clínico da DF, possuem uma grande utilidade, uma vez que existe uma relação evidente entre esta alteração e convergência fusional, e que por sua vez alterações desta estão relacionadas com astenopia. Pommering et al. (2000) estudaram o efeito do treino da Visão Binocular na curva de DF. Concluíram que o treino das vergências fusionais apresenta resultados significativos na diminuição da DF, reforçando a teoria que defende que a DF é muito importante como indicador da qualidade da cooperação binocular, e da própria Visão Binocular. Embora não impeça o desenvolvimento da Visão Binocular, existe ainda referência à diminuição do grau de estereopsia do indivíduo.
É portanto possível concluir que a importância da avaliação da DF reside numa primeira instância ao nível diagnóstico na prática clínica, uma vez que parece ser um bom indicador de alterações do equilíbrio oculomotor com alterações sintomáticas da Visão Binocular. Numa segunda instância, revela-se importante na investigação, clarificando causas e associações a sinais e sintomas no campo da Visão Binocular.