Esclerose Múltipla

Hoje dia 30 de Maio 2018, comemora-se o dia mundial da esclerose múltipla (EM). Este artigo descreve algumas condições oculares associadas a esta patologia.

Mais em: worldMSday2018 & AlertaLaranja

 

Manifestações oculares em doentes com esclerose múltipla (EM)

A Esclerose Múltipla (EM) é uma doença inflamatória crónica, desmielinizante e degenerativa do sistema nervoso central que interfere com a capacidade do mesmo em controlar funções como a visão, a locomoção, e o equilíbrio, entre outras. (Associação Nacional de Esclerose Múltipla, 2005).

Embora a causa da doença seja desconhecida, segundo a National Multiple Sclerosis Society (2006), muitos investigadores acreditam que a desmielinização se deve a uma resposta anómala por parte do sistema imunitário. Assim é possível que a EM esteja relacionada com uma doença auto-imune em que a mielina é o tecido agredido. Embora não se conheça o mecanismo envolvido, existem diversos factores que podem estar ligados à doença, tais como genéticos e/ou ambientais.

 

Segundo a Associação Nacional de Esclerose Múltipla (2005) estima-se que a EM afecte mais de um milhão de pessoas em todo o mundo. Os estudos epidemiológicos apontam para a existência de cerca de 500.000 indivíduos com EM só na Europa, sendo a incidência maior nos países nórdicos. Estima-se que o número de doentes em Portugal seja da ordem dos 8000.

A EM possui uma “tendência para afectar os nervos ópticos, quiasma óptico, tronco cerebral, pedúnculos cerebrais, medula espinal, apesar de nenhuma parte do sistema nervoso central estar protegida. O sistema nervoso periférico só raramente é afectado” (Riordan-Eva e Whitcher, 2004). Desta forma os sintomas mais frequentes são alterações da função cognitiva, depressão, descoordenação do andar e movimentos (ataxia), disartria, disfunção intestinal, sexual e urinária, dor, espasmos musculares, fadiga e fraqueza dos membros, parestesias, alterações do sistema visual e vertigens.

Devido à estreita relação do sistema visual com o sistema nervoso central, este pode ser afectado causando diversas alterações visuais. As mais comuns são a nevrite óptica, diplopia, nistagmus e inflamação intra-ocular. Contudo, o prognóstico de recuperação dos problemas visuais é normalmente positivo.

A nevrite óptica pode ser a primeira manifestação nestes doentes. Podem surgir episódios recorrentes e o olho contra lateral é afectado. A incidência da nevrite óptica na EM é de cerca de 90%, e a identificação de um envolvimento sintomático ou subclínico do nervo óptico é uma parte importante do diagnóstico” (Riordan-Eva e Whitcher, 2004). Segundo Harrington e Drake (1993), a EM é uma das causas mais comuns de nevrite óptica retrobulbar, resultando num defeito de campo visual com um escotoma central e definido numa grande variedade de formas. Frequentemente são relativos e efémeros, o que dificulta o controlo do êxito terapêutico através da avaliação perimétrica.

No que diz respeito ao envolvimento do nervo óptico, a EM é considerada uma patologia cujas manifestações são extremamente variáveis, podendo limitar-se a um escotoma central passageiro e recorrente em um ou ambos os olhos, ou podem ocorrer vários surtos que vão causando atrofia óptica, normalmente associada a com palidez bitemporal da papila do nervo óptico. Quando o escotoma central é progressivo desde o primeiro surto, poderá originar uma atrofia óptica. Neste caso, a recuperação visual é menos favorável.

A destruição da bainha de mielina provoca um atraso na condução do estimulo visual, e desta forma “a fiabilidade dos potenciais evocados visuais, especialmente através do tempo de latência, torna-os particularmente sensíveis a alterações da velocidade de condução na via óptica. Esta relação tem ganho valor diagnóstico na avaliação dos pacientes suspeitos de padecer de uma doença desmielinizante” (Harrington e Drake, 1993). Segundo Riordan-Eva e Whitcher (2004) os potenciais evocados visuais estão alterados, registando aumento significativo dos tempos de latência em 80% dos casos confirmados, 43% dos casos prováveis e 22% dos casos suspeitos de EM. Contudo, um exame meticuloso do campo visual, particularmente através da perimetria estática computorizada, pode ser suficientemente sensível para detectar escotomas relativos precoces, tendo ainda a vantagem de ser um exame acessível e económico.

Actualmente o estudo da retina através Optical Coherence Tomography (OCT) permite avaliar a camada de fibras nervosas, sendo que vários estudos já foram realizados no sentido de aplicar este principio de forma a conseguir um diagnóstico mais precoce em situações subclínicas e um controlo terapêutico e evolutivo mais eficiente.

De acordo com Nanjiani (1991), para além da diminuição de acuidade visual associada aos escotomas centrais, a nevrite óptica origina alterações da visão cromática verificando-se normalmente um defeito no eixo verde-vermelho.

Diplopia é um sintoma comum, frequentemente devido à oftalmoplegia internuclear sendo frequentemente bilateral. São menos comuns as lesões do terceiro e sexto par craniano localizados no tronco cerebral (Riordan-Eva e Whitcher, 2004). A oftalmoplegia internuclear é descrita por Von Noorden (1996), como uma alteração em que a adução do olho envolvido está abolida e o olho contralateral manifesta nistagmus em abdução, que são uma resposta secundária à fraqueza de adução e não são causados por uma alteração central. A causa localiza-se no fascículo longitudinal medial, que é frequentemente afectado nas doenças desmielinizantes, sendo a EM é a causa mais comum de oftalmoplegia internuclear bilateral.

Para além dos nistagmus associados à oftalmoplegia internuclear, podem surgir nistagmus do tipo pendular horizontal. Segundo Riordan-Eva e Whitcher (2004), estes nistagmus são um sinal inicial, que ao contrário da maioria das manifestações da doença é normalmente permanente (70%).

É possível ainda encontrar associado à EM outras alterações oculares. De acordo com Riordan-Eva e Whitcher (2004) pode ocorrer inflamação intraocular que afecta particularmente os vasos venosos na retina periférica em fases subclínicas. Nanjiani (1991) descreve ainda o sinal de Uhtoff, que consiste em sentir perda de visão, ou visão turva após exercício físico ou um banho quente, que se presume resultar de alterações na vascularização do nervo óptico devido a vasodilatação vascular ou cutânea.