“Testes” Gratuitos

Consultas Optometria gratuitas: Quem é a Culpa? Alguma coisa a fazer?


Negócios e profissões em todo o mundo atribuem um preço ao seu serviço. Esse preço é baseado em vários fatores, como a complexidade do serviço, o conhecimento necessário para realizar o serviço e a disponibilidade desse serviço.

Em Portugal, os cerca de 1000 oftalmologistas cobram por uma consulta um valor superior a 50€, na maioria dos casos, porque o serviço é complexo, necessita curso medicina mais 4 anos a completar formação em oftalmologia.

Em Optometria, existem cerca de 2000 optometristas licenciados, que na grande maioria dos casos não cobram pelo seu serviço, mesmo sendo um serviço complexo e, com uma formação superior durante cerca de 3 a 4 anos em média.

Nos EUA, Reino unido, Canadá, entre outros países, os optometristas cobram uma taxa apropriada por seu serviço. Por exemplo no Canadá, os Optometristas cobram cerca de 80-120$ aos particulares.

O que aconteceu em Portugal?

A resposta é multifatorial. Viajando ao passado parece que um grande grupo multinacional lançou o slogan do teste gratuito, e continua até aos dias de hoje. Atualmente, um dos fatores importantes é a venda de óculos ser cada vez mais barata, graças a ordenados precários, mão de obra não qualificada e uma qualidade reduzida dos produtos. Assim, com menos lucro por cliente, origina uma maior dependência da quantidade de consultas. A forma mais simples e menos criativa de resolver este problema é oferecer um “teste” gratuito. Isso aumenta a probabilidade de uma venda. No entanto, ao fazer isso, inevitavelmente desvaloriza o serviço prestado.


Se uma determinada habilidade profissional é altamente valorizada, mantém a integridade da profissão. Alternativas poderia incluir, por exemplo, manter o mesmo valor da consulta, e dar um desconto nos óculos. Dessa forma, o valor do serviço é mantido e o paciente é recompensado por ser leal.


Oferecer “exames de vista” gratuitamente, transmite uma mensagem claríssima para o público: é um serviço de baixo valor e enganador. A mensagem para o profissional é: você não tem valor profissional e só é preciso para converter pacientes em dinheiro. Isto é agravado pela definição de metas de vendas, taxas de conversão e, em alguns casos infelizmente até mesmo chamar o profissional pelo nome incorreto.


Apesar da maioria dos Optometristas não estarem de acordo com a gratuitidade dos seus serviços, estão sujeitos às regras da entidade empregadora, normalmente empresários que atalham pelo caminho mais fácil.


Para apimentar a situação, existe a associação nacional dos ópticos (ANO) que nos últimos tempos tem tentado diminuir os salários e competências dos Optometristas, como é o caso da proposta de inserção de ortoptistas como responsáveis técnicos das óticas. Talvez por isso e não só, esta associação tenha uma representatividade exígua e com tendência a diminuir.


Acresce ainda o facto de, num pais de significativas desigualdades, a consulta de optometria não está isenta de 23% de IVA, contrariamente aos técnicos de diagnóstico e terapêutica (ex. ortoptistas) ou até mesmo, os profissionais das terapêuticas não convencionais (ex. homeopatas).


Ainda assim, existem vários Optometristas independentes que cobram adequadamente a sua consulta e respetivos serviços complementares, como os relatórios para a carta de condução, onde os seus pacientes ficam satisfeitos em pagar pelo serviço, e continuam leais trazendo os seus amigos e familiares para a consulta. O principal problema, porém, é que esse modelo tende a funcionar apenas em determinadas áreas e onde o serviço já é conhecido há algum tempo.

O ciclo de depressão do exame gratuito é o seguinte:

Muita competição >> Mais impostos >>> Margem lucro menor >>> Desregulamentação da profissão >>> Ausência de fiscalização >>> Taxa reduzida ou ausente da consulta de optometria >>> Mais ênfase na venda de óculos >>> Muita competição e assim o ciclo continua.

Como sair dessa rotina?

Esta resposta, novamente, está em várias partes:
1) Melhore o seu serviço, por exemplo adquirindo novo equipamento diagnóstico.
2) Invista em formação continua e de especialização.
3) Esteja informado e participe na regulamentação da profissão.
4) Pressione a ANO para valorizar a profissão em vez de a depreciar.
5) Discuta as vantagens do serviço NÃO gratuito com o seu empregador.
6) Valorize o seu trabalho e conhecimento, cobre e aprecie o valor da consulta de optometria.

Conclusão
O conceito de “teste/consulta gratuita” desprestigia e desacredita o profissional Optometrista assim como o local de trabalho associado. A mudança de postura é indispensável para um maior reconhecimento e, melhoria das condições de trabalho.


Este artigo foi escrito por um membro Optovisionarium e as suas opiniões podem não refletir as opiniões do grupo Optovisionarium. A publicação deste artigo reflete a nossa missão de encorajar a discussão dentro da profissão.

One thought on ““Testes” Gratuitos

  1. Excelente análise.
    Foram os “testes gratuitos”, a prescrição seguida da venda forçada e o colar do optometrista ao comércio de óptica que nos destruiu. Neste momento já não temos forma de voltar atrás. Sem querer parafrasear o Sr. Dr. da SPO, mas sabendo que ele tinha toda a razão “A Optometria acabou, os optometristas é que não sabem”.

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